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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Informativo 714 STF - 5 a 9 de agosto de 2013

Imunidade tributária e imóvel vago
A 1ª Turma, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que discutido se imóvel não edificado pertencente ao Serviço Social da Indústria - SESI estaria alcançado pela imunidade tributária. Na espécie, reconheceu-se que, por ser o recorrido entidade de direito privado, sem fins lucrativos, encaixar-se-ia na hipótese do art. 150, VI, c, da CF e, por isso, estaria imune. Apontou-se que a constatação de que imóvel vago ou sem edificação não seria suficiente, por si só, para destituir a garantia constitucional da imunidade tributária. Ponderou-se que, caso já tivesse sido deferido o status de imune ao contribuinte, o afastamento dessa imunidade somente poderia ocorrer mediante prova em contrário produzida pela administração tributária. Asseverou-se não ser possível considerar que determinado imóvel destinar-se-ia a finalidade diversa da exigida pelo interesse público apenas pelo fato de, momentaneamente, estar sem edificação ou ocupação. Assinalou-se que a qualquer momento poderia deixar sua condição de imóvel vago. Vencido o Min. Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso. Assentava não poder concluir que um imóvel não edificado estivesse diretamente relacionado a serviço prestado. Explicitava que a imunidade do art. 150, VI, c, da CF não seria linear, tendo em vista a restrição disposta no seu § 4º (“As vedações expressas no inciso VI, alíneas ‘b’ e ‘c’, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”).

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

IPTU: majoração da base de cálculo e decreto (Transcrições)

(v. Informativo 713)

RE 648245/MG*

RELATOR: Min. Gilmar Mendes

Recurso extraordinário. 2. Tributário. 3. Legalidade. 4. IPTU. Majoração da base de cálculo. Necessidade de lei em sentido formal. 5. Atualização monetária. Possibilidade. 6. É inconstitucional a majoração do IPTU sem edição de lei em sentido formal, vedada a atualização, por ato do Executivo, em percentual superior aos índices oficiais. 7. Recurso extraordinário não provido.

Relatório: Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que negou provimento ao recurso de apelação interposto pela Fazenda Pública do Município de Belo Horizonte, com a pretensão de reformar sentença que julgou procedente ação de revisão de lançamento, a fim de reconhecer a inconstitucionalidade de majoração do IPTU, no exercício de 2006, acima do índice de inflação acumulado naquele período, sem a prévia aprovação de lei.
O acórdão recorrido está assim ementado:

“AÇÃO ORDINÁRIA – IPTU – MAJORAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO – NECESSIDADE DE EDIÇÃO DE LEI. A majoração da base de cálculo do IPTU, por implicar aumento de tributo, está adstrita à existência de lei em sentido formal, consectário do princípio da legalidade preconizado no art. 150, I, da CR, e no art. 97, do CTN”.

O recorrente alega, em síntese, que a lei municipal prevê os critérios gerais a serem aplicados quando da avaliação dos imóveis, e que estes teriam sido observados na cobrança do imposto em discussão.
Em contrarrazões, os recorridos aduzem que a matéria em questão já está pacificada nos Tribunais Superiores, requerendo que o recurso não seja conhecido e, no mérito, seja-lhe negado provimento.
O presente recurso não foi admitido pelo Tribunal a quo.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada (tema 211).
Dei provimento a agravo de instrumento para determinar a subida do recurso extraordinário (AI 764.518 MG).
Deferi o ingresso no feito, na condição de amici curiae, das entidades Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras (ABRASF).
A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não provimento do recurso.
É o relatório.

Voto: O acórdão recorrido está em conformidade com a orientação desta Corte. É firme o entendimento deste Tribunal no sentido de que a majoração do valor venal dos imóveis para efeito da cobrança de IPTU não prescinde da edição de lei, em sentido formal, exigência que somente se pode afastar quando a atualização não excede os índices inflacionários anuais de correção monetária.

O princípio constitucional da reserva legal, previsto no inciso I do art. 150 da Constituição Federal, é claro ao vedar a exigência e o aumento de tributo sem lei que o estabeleça. Trata-se de prescrição fundamental do sistema tributário, que se coliga à própria ideia de democracia, aplicada aos tributos (“no taxation without representation”).

Afora as exceções expressamente previstas no texto constitucional, a definição dos critérios que compõem a regra tributária – e, entre eles, a base de cálculo – é matéria restrita à atuação do legislador. Não pode o Poder Executivo imiscuir-se nessa seara, seja para definir, seja para modificar qualquer dos elementos da relação tributária.

Nesse mesmo diapasão, é cediço que os Municípios não podem alterar ou majorar, por decreto, a base de cálculo do imposto predial. Podem tão somente atualizar, anualmente, o valor dos imóveis, com base nos índices oficiais de correção monetária, visto que a atualização não constitui aumento de tributo (art. 97, § 1º, do Código Tributário Nacional) e, portanto, não se submete à reserva legal imposta pelo art. 150, inciso I, da Constituição Federal.

São muitos os precedentes nesse sentido: RE 234.605, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 8.8.2000, Primeira Turma, DJ 1º.12.2000; AI 534.150-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe 30.4.2010; RE 114.078, Rel. Min. Moreira Alves, Plenário, DJ 1º.7.1988.
A propósito, veja-se o AI–AgR 450.666, de relatoria do Ministro Carlos Velloso:

“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. VALOR VENAL DO IMÓVEL. ATUALIZAÇÃO. NECESSIDADE DE LEI EM SENTIDO FORMAL. I. - É vedado ao Poder Executivo Municipal, por simples decreto, alterar o valor venal dos imóveis para fins de base de cálculo do IPTU. Precedentes. II. - Agravo não provido.”

Também, no mesmo sentido, vale mencionar o julgamento do RE 234.605, de relatoria do Ministro Ilmar Galvão:

“O Senhor Ministro Ilmar Galvão – (Relator): Dispõe o art. 97 e seus inc. II e §§1º e 2º, do CTN, in verbis:

“Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
...
II – a majoração de tributos...
1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso.
§ 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.”

Decorre dos trechos transcritos, obviamente, a possibilidade de os Municípios, para efeito de lançamento do IPTU, considerarem, anualmente, o valor do imóvel atualizado de conformidade com os índices oficiais de correção monetária.

Prevenindo abusos de parte das Administrações Municipais, os dispositivos em apreço foram interpretados pelo STF no sentido de que, salvo a hipótese acima exposta, somente por meio de lei, editada com observância ao princípio da anterioridade, poderá o Poder Público alterar a base de cálculo do tributo em bases superiores aos revelados pelos índices oficiais de correção monetária, mediante a publicação das chamas “Plantas de Valores”, de ordinário, como se sabe, ditadas ser qualquer atenção aos mencionados índices.” (RE 234.605, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 8.8.2000, Primeira Turma, DJ de 1º.12.2000.)

Na mesma linha, cito os seguintes julgados:

“TRIBUTÁRIO. IPTU. REAJUSTE DO VALOR VENAL DOS IMÓVEIS. DECRETO MUNICIPAL. INVIABILIDADE. O acórdão impugnado mostra-se coerente com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, ao decidir que a atualização do valor venal de imóveis, para efeito de cálculo do IPTU, deve ser feita somente mediante lei em sentido formal, sendo inviável por meio de decreto do prefeito. Precedentes: AGRAG 176.870 e RE 234.605. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(AI 346.226 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 4.10.2002, Primeira Turma)

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PREQUESTIONAMENTO - AUMENTO DE TRIBUTO - DECRETO. Mostra-se objeto de debate e decisão previos, tema alusivo ao aumento de tributo via decreto quando conste do acórdão proferido a exigibilidade de lei. TRIBUTO – REAJUSTE X AUMENTO - DECRETO X LEI. Se de um lado e certo assentar-se que simples atualização do tributo, tendo em conta a espiral inflacionaria, independe de lei, isto considerado o valor venal do imóvel (IPTU), de outro não menos correto e que, em se tratando de verdadeiro aumento, o decreto-lei não e o veículo próprio a implementá-lo. A teor do disposto no inciso I, do artigo 150 da Constituição Federal, a via própria ao aumento de tributo e a lei em sentido formal e material.”
(AI 176.870 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 26.4.1996, Segunda Turma)
.
Vê-se, assim, que a orientação assentada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o valor cobrado a título de imposto sobre propriedade predial e territorial urbana (IPTU) pode ser atualizado, anualmente, independentemente da edição da lei, desde que o percentual empregado não exceda a inflação acumulada nos doze meses anteriores.

No caso em tela, todavia, assentou a decisão recorrida que o incremento no valor cobrado, a título de imposto predial, excede consideravelmente o percentual cabível, em termos de atualização monetária. Em vez de aplicar o percentual de 5,88%, correspondente à variação do IPCA/IBGE entre os meses de janeiro a dezembro de 2006, a Fazenda Municipal de Belo Horizonte, por meio do Decreto 12.262/2005, majorou o valor venal dos imóveis em questão em mais de 58%, no ano de 2006.

A cobrança assim majorada representa, por via oblíqua, aumento de imposto sem amparo legal, o que justifica a revisão do lançamento tributário, como se procedeu na instância a qua. O acórdão, portanto, não destoa da jurisprudência desta Corte, razão pela qual não merece reforma.
Diante desses argumentos, concluo que é inconstitucional a majoração do IPTU sem edição de lei em sentido formal, tal como decidiu o acórdão recorrido.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso extraordinário.

Fonte: STF

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