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quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A competência destinada à União e a possibilidade de fiscalização e cobrança atribuída aos Municípios em Relação ao Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - Por Mário Roberto Rodrigues Martins

O imposto sobre a propriedade territorial rural, conhecido como ITR, é de competência da União Federal, conforme estabelecido na Carta Magna, art. 153, VI, e art. 29, CTN. 

Verificamos que tal competência era, no regime da Constituição de 1946, imputada aos Estados (art. 19, I, CF/1946). Todavia, com o advento da Emenda Constitucional n. 5, de 1961, a competência foi transplantada para os Municípios, que por sua vez não contavam com instrumentos necessários à sua cobrança, face a proximidade dos interesses ligados ao latifúndio.

Finalmente, com a Emenda Constitucional n. 10, de 1964, a Competência para instituição do referido Tributo passou a ser da União.

A competência destinada à União Federal não se deu por acaso, pois tal imposto possui função predominantemente extrafiscal, funciona como instrumento auxiliar do disciplinamento estatal da propriedade rural, e como a União é responsável por tal disciplinamento, nada mais natural que seja a ela destinada a competência relativa ao referido imposto.

Nesse desiderato, o ITR é considerado um instrumento importante no combate aos latifúndios improdutivos, tendo a Constituição Federal, através do poder Constituinte Derivado, autorizado a instituição de alíquotas progressivas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas (art. 153, §4°, I, CF). Por isso a Lei n. 9.393, de 19 de dezembro de 1996, estabeleceu alíquotas progressivas em função da área do imóvel e do grau de sua utilização. 

Não há que se confundir quanto à competência da União, na instituição de tal tributo, com a possibilidade de fiscalização e cobrança, que pode ser atribuída aos Municípios na forma do art. 153, §4º, III, CRFB/88. 

O Código Tributário Nacional, no art. 6°, prescreve que “A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei.”. Como resultado da definição constitucional, Luciano Amaro afirma que a competência tributária daria a tais pessoas políticas,

dentro de certos limites, o poder de criar determinados tributos e definir seu alcance, obedecidos os critérios de partilha de competência estabelecidos pela Constituição. A competência engloba, portanto, um amplo poder político no que respeita a decisões sobre a própria criação do tributo e sobre a amplitude da incidência, não obstante o legislador esteja submetido a vários balizamentos[1] .

Importa salientar que a União possui competência privativa para a imposição do ITR, sendo, portanto, o único Ente político autorizado pela Constituição Federal para instituí-lo. Tal competência é indelegável, pois mesmo no caso de lacunas, a competência privativa impede que outro Ente a exerça. O que pode ser delegado, segundo o art. 7º, CTN é a atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, e segundo Hugo de Brito Machado,

“É indelegável a competência tributária. A pessoa jurídica à qual tenha a Constituição atribuído competência para instituir certo tributo não pode transferir essa competência. Admitir a delegação de competência para instituir o tributo é admitir seja a Constituição alterada por norma infraconstitucional. É razoável, todavia, admitir-se a delegação, a outra pessoa jurídica de Direito público, das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária (art. 7º, CTN). Pelo menos até que em sentido contrario venha dispor a lei complementar, assim se pode entender, em face da recepção do Código Tributário Nacional pela vigente Constituição”[2].

A distribuição de receita não afeta a competência, pois conforme o art. 6º, parágrafo único, CTN, os tributos cuja receita seja distribuída, no todo ou em parte, a outras pessoas jurídicas de direito público pertencem à competência legislativa daquela a que tenham sido atribuídos.

A competência para a instituição do ITR é privativa da União, podendo ser delegado aos Municípios a função de fiscalizar e cobrar, se assim optarem, o imposto referido. Mas essa opção pode gerar algumas conseqüências no que pertine à distribuição do produto da arrecadação, o que pode se tornar uma difícil escolha por parte dos Municípios.

Após a Emenda Constitucional n. 42, de 2003, foi introduzido no texto Constitucional o inciso III no art. 153, §4º (possibilitando a opção entre fiscalizar e cobrar o ITR por parte dos Municípios), bem como o art. 158, II. Esse reflete a opção efetuada quanto àquele, trazendo as consequências da referida opção.

Em decorrência do inciso III supra destacado, foi publicada a Lei 11.250, de 27/12/2005, prevendo a celebração de convênios entre a União e o Distrito Federal ou os Municípios que assim optarem, no intuito de delegar as atribuições de fiscalização, inclusive a de lançamento dos créditos tributários, e de cobrança do ITR, sempre observando a legislação federal de regência do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural. É importante destacar que a respectiva opção não poderá implicar redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal. Para uma análise mais detalhada e uma melhor visualização, deveremos observar as duas possibilidades, uma com o Município fiscalizando e cobrando o ITR, e outra optando por não arrecadá-lo nem fiscalizá-lo.

No primeiro momento temos o Município optando por cobrar e fiscalizar o tributo. Nesse caso será vedada qualquer forma de renúncia fiscal, não haverá sequer nenhuma forma de redução do imposto, porém, o produto total da arrecadação referente aos imóveis situados no Município será destinado ao mesmo. 

Em um segundo momento, imaginemos o Município recusando-se a cobrar e fiscalizar o imposto, ocorrendo tal possibilidade, será destinado ao mesmo cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados.

Em síntese, o Município recebe 50% do produto arrecadado com o ITR incidente sobre os imóveis nele situados. Contudo, caso o Município opte por fiscalizar e cobrar o imposto, na forma da lei n. 11.250/05, desde que a opção não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal, a ele caberá a totalidade da arrecadação, ou seja, caso o Município opte por arrecadar e fiscalizar o tributo receberá 100% do produto da arrecadação.



[1] Cf. AMARO, Luciano, Direito Tributário Brasileiro, 6.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.93.
[2] Cf. MACHADO, Hugo de Brito, Curso de Direito Tributário, 27.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. P. 285.

Mário Roberto Rodrigues Martins é Delegado de Polícia Civil do Estado de Minas Gerais.

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