Páginas

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Conceito de Imunidade Tributária - Por Leonardo Sia

A doutrina na análise da imunidade tributária diverge na distinção de sua natureza jurídica e seu conceito. Todos os posicionamentos buscam delimitar o instituto com o propósito de bem representar o fenômeno das imunidades.

Há posicionamentos diversos, que a entendem como: hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada, exclusão ou supressão do poder tributário, limitação constitucional à competência, limitação constitucional ao poder de tributar e normas de estrutura estabelecidas na Constituição.

Vejamos cada um desses conceitos.

O Professor José Souto Maior Borges entende que imunidade tributária é a hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada:

“regra imunizante configura, desta sorte, hipótese de não-incidência constitucionalmente qualificada. Quando se destaca no ordenamento jurídico um setor normativo autônomo – as regras tributárias – a análise constata a existência de duas modalidades distintas pelas quais se manifesta o fenômeno denominado não-incidência: I) a não-incidência genérica ou pura e simples, e II) a não-incidência juridicamente qualificada ou especial; não-incidência por determinação constitucional, de lei ordinária ou complementar. A imunidade tributária inclui-se, pois, nesta segunda alternativa. A não-incidência pura e simples ocorre quando inexistentes os pressupostos de fato idôneos para desencadear a incidência, automática e infalível, de norma sobre a sua hipótese de incidência realizada concretamente (fato gerador). A não-incidência por imunidade constitucional decorre da exclusão de competência impositiva do poder tributário”.

Entendemos que o conceito é equivocado, pois a expressão não incidência pode ser utilizada tanto para significar aquelas situações não jurisdicizadas pelo direito positivo, como aqueles fatos cujo conceito não possuem as notas descritas no conceito extraído da hipótese de incidência, como suficientes para dar ensejo à causalidade normativa, a qual enseja o nascimento da relação jurídico-tributária.

O Professor Rui Barbosa Nogueira entende que a não-incidência "é o inverso, isto é, o fato de a situação ter ficado fora dos limites do campo tributário, ou melhor, a não-ocorrência do fato gerador, porque a lei não descreve a hipótese de incidência."

Há doutrinadores que defendem a ideia de que as imunidades constituem hipóteses de exclusão ou supressão de parte do denominado poder tributário entregue às pessoas políticas.

Na posição do Professor José Eduardo Soares de Melo "a imunidade consiste na exclusão de competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para instituir tributos relativamente a determinados atos, fatos e pessoas, expressamente previstas na Constituição Federal."

O Professor Rui Barbosa Nogueira, imunidade é "uma forma de não-incidência pela supressão da competência impositiva para tributar certos fatos, situações ou pessoas, por disposição constitucional." 

O Professor Paulo de Barros Carvalho aponta o equívoco que se verifica nesta concepção. Inicialmente, refere-se à etimologia das palavras supressão e exclusão. A etimologia dos verbos excluir e suprimir, como aponta o mestre, no que se refere ao primeiro (excluir), vem do verbo latino excludere, que tem o significado de pôr de parte, expulsar, excetuar, afastar, tirar da lista. Suprimir vem de supprimere, tem o sentido de extinguir, fazer desaparecer, eliminar, anular, cortar, deitar fora.

Observa que exclusão pressupõe a expulsão de algo que estivera incluído, suprimir, por sua vez, traz à mente o ato de anular, de eliminar, de cancelar. Daí decorre que primeiramente deve estar incluído, ou seja, deve haver a competência ou poder tributário, para, num momento posterior, ser ela excluída ou suprimida.

Continuando, Segundo o Professor Paulo de Barros Carvalho:

"De fato, só um apelo direto ao método diacrônico, inerente à investigação histórica, porém incompatível no plano da Ciência do Direito, poderia ter o condão de suster raciocínio desse quilate. Carrega dentro de si a suposição de dois instantes cronologicamente distintos: um, em que fossem definidas as faixas de competência tributárias entregues às entidades políticas; outro, posterior, quando se introduzem preceitos excludentes ou supressores de parcelas daqueles canais".

E Clélio Chiesa entende da mesma forma:

"Defender que a imunidade é a supressão ou exclusão do "poder tributário" pressupõe admitir cronologia entre as normas que outorgam competência aos entes tributantes e às normas imunizantes. É como se primeiro ocorresse a incidência das normas imunizantes e, ato contínuo, ocorresse a supressão ou exclusão de parte dessa competência".

Todavia, não há sucessão cronológica entre as normas jurídicas quanto à incidência delas aos fatos que ocorrem no mundo fenomênico. Assim, tanto as normas de disciplinam a competência quanto às que contemplam as hipóteses de imunidades propagam seus efeitos no mesmo instante, dimensionando o campo tributável.

Portanto, observa-se que essa concepção também não representa de modo adequado o fenômeno das imunidades, porque supõe a ocorrência de cronologia entre as normas instituidoras de competência e a regra imunizante.

Há quem defenda a tese de que as imunidades são uma limitação constitucional à competência tributária e, outros, que entendem que trata-se de uma limitação ao poder de tributar, teses que são acolhidas por renomados juristas.

O Professor Hugo de Brito Machado entende que a imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É uma limitação da competência tributária. 

Rubens Gomes de Souza refere-se às imunidades como proibições contidas na Constituição e que representam limitações a competência tributária, sendo seguido por Ives Gandra da Silva Martins e Aliomar Baleeiro.

Entendemos que o raciocínio não procede, acarretando o mesmo equívoco que apresenta a tese da imunidade como uma exclusão ou supressão do poder tributário, haja vista que também pressupõe a existência de cronologia entre as normas de outorga de competência e as que contemplam hipóteses de imunidades.

O Professor Paulo de Barros Carvalho, posição a qual nos filiamos, entende que a imunidade tributária é classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas e que elas cuidam-se de normas de estrutura (também denominadas normas de produção, de formação ou de transformação de outras normas) posto que estabelecem o modo de criar ou alterar regras jurídicas válidas no sistema jurídico, dirigindo-se ao legislador e não à região material da conduta. Os preceitos imunizantes incluir-se-iam no subdomínio das sobrenormas, metaproposições prescritivas que colaboram, positiva ou negativamente, para traçar a área de competência dos entes tributantes, delineando os limites de sua atividade legiferante.

O Professor Roque Antônio Carrazza analisando a posição defendida pelo Professor Paulo de Barros Carvalho afirma que o posicionamento do mestre assevera que as imunidades tributárias tratam-se de normas de estruturas, pois não se dirigem à região material da conduta, mas à forma de se criar normas, motivo pelo qual dispõe acerca do comportamento que possa introduzir normas no direito positivo.

Quanto a outra parte da questão, sobre conceito de imunidade tributária poder ser aplicável às taxa e às contribuições de melhoria, percebe-se que a doutrina é quase unânime em reconhecer que as imunidades não atingem somente os impostos, exações não vinculadas segundo classificação de Geraldo Ataliba, mas os tributos como gênero, abarcando os impostos, taxas e contribuições de melhoria e, para aqueles que reconhecem mais espécies tributárias, as demais exações.

O argumento daqueles que apregoam que as imunidades somente se referem à tributos não-vinculados, são: que o texto da Constituição Federal, em seu artigo 150, inciso VI, cita especificamente estas espécies de tributos; segundo, porque os impostos são concebidos para as despesas gerais do Estado, enquanto que as demais espécies tributárias pressupõe uma atividade do estado, seja o exercício do poder de polícia, a prestação de um serviço público ou a valorização imobiliária decorrente de obra pública, o que as tornariam incompatíveis com as imunidades.

O Professor Paulo de Barros Carvalho, posição a qual nos filiamos, aponta o equívoco sobre tais argumentos no sentido de que “a imunidade é instituto que só se refere aos impostos carece de consistência veritativa. Traduz exacerbada extensão de uma particularidade constitucional que pode ser facilmente enunciada mediante a ponderação de outros fatores, também extraídos da disciplina do Texto Supremo. Não sobeja repetir que, mesmo em termos literais, a Constituição brasileira abriga regras de competência da natureza daquelas que se conhecem pelo nome de imunidades tributárias, e que trazem alusão explícita às taxas e à contribuição de melhoria, o que basta para exibir a falsidade da proposição descritiva”.
_______________________

Leonardo Sia é Mestrando em Filosofia pela UERJ, Especialista em Direito Tributário pelo IBET e em Direito Público e Privado pelo Instituto Superior do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Professor Seminarista da Pós-Graduação em Direito Tributário do IBET, da UNESA, dos Cursos Fiscais do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) e de Contabilidade e Logística do Senac.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.