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quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Informativo 549 STF - 28 de novembro a 2 de dezembro de 2016

PLENÁRIO

Federalismo fiscal e omissão legislativa - 2
O Plenário, em conclusão, julgou procedente ação direta de inconstitucionalidade por omissão ajuizada em face de alegada lacuna legislativa, no tocante à edição, pelo Congresso Nacional, da lei complementar prevista no art. 91 do ADCT, incluído pela Emenda Constitucional 42/2003 (“Art. 91. A União entregará aos Estados e ao Distrito Federal o montante definido em lei complementar, de acordo com critérios, prazos e condições nela determinados, podendo considerar as exportações para o exterior de produtos primários e semi-elaborados, a relação entre as exportações e as importações, os créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e a efetiva manutenção e aproveitamento do crédito do imposto a que se refere o art. 155, § 2º, X, ‘a’”) — v. Informativo 848. O Colegiado declarou haver mora, por parte do Congresso Nacional, em editar a aludida lei complementar. Fixou, por maioria, o prazo de doze meses para que seja sanada a omissão. No ponto, ficou vencido o ministro Marco Aurélio, que não determinava prazo.

O Tribunal estabeleceu, também por decisão majoritária, que, na hipótese de o mencionado prazo transcorrer “in albis”, caberá ao Tribunal de Contas da União (TCU): a) fixar o valor total a ser transferido anualmente aos Estados-Membros e ao Distrito Federal, considerando os critérios dispostos no art. 91 do ADCT, a saber, as exportações para o exterior de produtos primários e semielaborados, a relação entre as exportações e as importações, os créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e a efetiva manutenção e aproveitamento do crédito do imposto a que se refere o art. 155, § 2º, X, “a”, do texto constitucional; b) calcular o valor das quotas a que cada um fará jus, levando em conta os entendimentos entre os Estados-Membros e o Distrito Federal realizados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Determinou, ainda, que se comunique ao TCU, ao Ministério da Fazenda, para os fins do disposto no § 4º do art. 91 do ADCT, e ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, para adoção dos procedimentos orçamentários necessários ao cumprimento da presente decisão, notadamente no que se refere à oportuna inclusão dos montantes definidos pelo TCU na proposta de lei orçamentária anual da União. Vencidos, no particular, os ministros Marco Aurélio, Teori Zavascki e Cármen Lúcia (Presidente), que não subscreviam as determinações dirigidas ao TCU.

O Colegiado considerou atendidos os requisitos da legitimidade ativa e da pertinência temática. Afinal, nos termos da jurisprudência da Corte, é necessário haver pertinência entre o objeto da ação e a defesa do interesse em causa. No caso dos governadores, a legitimidade está condicionada à repercussão do ato normativo impugnado nas atividades de interesse dos Estados-Membros, como na hipótese em debate.

No mérito, entendeu que o tema envolve autonomia financeira e partilha de recursos tributários. Embora o texto original da Constituição tivesse promovido esforços para descentralizar as receitas, a União, por meio das contribuições (cuja receita não é compartilhada com os demais entes), conseguiu reverter o quadro de partilha, concentrando em seu poder a maior parte dos recursos tributários arrecadados. A partir do Plano Real, houve incremento da participação das receitas de contribuições no total de receitas correntes da União, sem o respectivo incremento na participação das receitas tributárias. Assim, se, por um lado, o constituinte desenhou um quadro fiscal fortemente descentralizado quanto aos impostos, por outro, deixou nas mãos da União, livres de qualquer partilha de arrecadação, outra espécie tributária: as contribuições, especialmente as sociais.

Nesse contexto, a edição da Emenda Constitucional 42/2003 traduziu um esforço de desoneração de exportações, com impacto nas finanças estaduais. Por consequência, elevou ao plano constitucional tanto a tentativa de desoneração da Lei Complementar 87/1996 quanto a obrigatoriedade de repasses mensais a cargo da União. Além disso, as exportações brasileiras foram completamente removidas do campo de incidência do ICMS. Criou-se, portanto, uma imunidade constitucional, em prejuízo de uma fonte de receita pública estadual.

Se, por um lado, a modificação prestigia e incentiva as exportações em prol de toda a Federação, por outro, traz consequências severas sobretudo para quem se dedica à exportação de produtos primários. Por isso, para compensar a perda de arrecadação imposta pela Emenda Constitucional 42/2003, estabeleceu-se, no art. 91 do ADCT, uma fórmula de transferência constitucional obrigatória da União em favor dos Estados-Membros e do Distrito Federal. Esse mecanismo, em tese, poderia representar importante instrumento de federalismo cooperativo, de sorte a atenuar os impactos financeiros decorrentes da desoneração promovida pela Emenda Constitucional 42/2003 nas contas estaduais. Entretanto, a lei complementar prevista no art. 91 do ADCT nunca foi editada e, até hoje, a regra do § 3º deste dispositivo continua sendo aplicada.

A Corte ainda assinalou que existe um dever constitucional de legislar, previsto no art. 91 do ADCT, e uma omissão legislativa que perdura por mais de dez anos. Isso traz consequências econômicas relevantes, sobretudo em relação a determinados Estados-Membros. Além disso, embora falte a lei complementar exigida pela Constituição, a legislação em vigor traz critérios provisórios para os repasses. Isso, entretanto, não basta para afastar a omissão em debate. Ao contrário, o sentido de provisoriedade do § 2º do art. 91 do ADCT só confirma a lacuna legislativa e não tem o condão de convalidá-la. Está, portanto, configurado o estado de inconstitucionalidade por omissão, em razão de mora do Poder Legislativo.

Diante disso, considerou necessário adotar solução no sentido de, decorrido “in albis” o prazo de doze meses estipulado para que o Legislativo saneie a omissão, caber ao TCU, enquanto não sobrevier lei complementar, a competência para definir anualmente o montante a ser transferido, na forma do art. 91 do ADCT, considerando os critérios ali dispostos. Quanto à repartição entre os diversos entes federados, propôs ser feita nas condições estabelecidas pelo Confaz, de modo que a distribuição de recursos leve em conta o ICMS desonerado nas exportações de produtos primários e semielaborados e os créditos de ICMS decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente.

Por fim, explicou que o TCU é a instituição mais adequada para cumprir temporariamente essa incumbência (CF, art. 161, parágrafo único). Ademais, é o órgão escolhido pelo legislador para o cálculo da participação de cada Estado-Membro ou do Distrito Federal na repartição da receita tributária a que se refere o art. 159, II, da CF. Caberá, assim, aos Estados-Membros e ao Distrito Federal proceder na forma do § 4º do art. 91 do ADCT, de modo a apresentar à União, nos termos das instruções baixadas pelo Ministério da Fazenda, as informações relativas ao imposto de que trata o art. 155, II, da CF, declaradas pelos contribuintes que realizarem operações ou prestações com destino ao exterior, a fim de subsidiar o TCU na fixação do montante a ser transferido, bem como das quotas a que terão direito os entes federados. Advindo a lei complementar, cessa a competência da Corte de Contas, conferida de forma precária e excepcional.




Fonte: STF


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