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quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Informativo 795 STF - 17 a 21 de agosto de 2015

REPERCUSSÃO GERAL

DJe de 17 a 21 de agosto de 2015

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 889.173-MS
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL. MANDADO DE SEGURANÇA. VALORES DEVIDOS ENTRE A DATA DA IMPETRAÇÃO E A IMPLEMENTAÇÃO DA ORDEM CONCESSIVA. SUBMISSÃO AO REGIME DE PRECATÓRIOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 851.108-SP
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. ITCMD. BENS LOCALIZADOS NO EXTERIOR. ARTIGO 155, § 1º, III, LETRAS A E B, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR. NORMAS GERAIS. COMPETÊNCIA PARA INSTITUIÇÃO.
É de se definir, nas hipóteses previstas no art. 155, § 1º, III, letras a e b, da Constituição, se, ante a omissão do legislador nacional em estabelecer as normas gerais pertinentes à competência para instituir imposto sobre transmissão causa mortis ou doação de quaisquer bens ou direitos (ITCMD), os Estados-membros podem fazer uso de sua competência legislativa plena com fulcro no art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34, § 3º, do ADCT.

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Plano Verão: IRPJ e correção monetária de balanço (Transcrições)

(v. Informativo 795)

RE 188.083/PR*

RELATOR: Ministro Marco Aurélio

LEI – APLICAÇÃO NO TEMPO – TRIBUTO – IRRETROATIVIDADE. Lei regedora de tributo há de ser editada em certo exercício, para observância no subsequente.

BALANÇO – CORREÇÃO MONETÁRIA – EXERCÍCIO DE 1989 – ARTIGO 30, § 2º, DA LEI Nº 7.799/89. Ante o princípio da irretroatividade, surge inconstitucional o § 2º do artigo 30 da Lei nº 7.799/89, no que impôs a correção monetária das demonstrações financeiras referentes ao exercício de 1989.

RELATÓRIO: O Tribunal Regional Federal da 4ª Região acolheu pedido formulado em apelação, sufragando tese assim sintetizada na ementa do acórdão de folha 247 a 250:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. CORREÇÃO MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS DO EXERCÍCIO DE 1989. LEI Nº 7.799/89, arts. 2º e 3º. Constitucionalidade da exigência. Recurso provido (folha 250).

Sobreveio a protocolação de embargos de declaração, acolhidos para esclarecer que “os fundamentos para a decisão tomada são também os do acórdão desta Turma, de 12 de março de 1992, de fl. 173, e os votos que dela fazem parte integrante” (folha 266).
No extraordinário de folha 270 a 288, interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, articula-se com a configuração de ofensa ao artigo 150, inciso III, alíneas “a” e “b”, da Carta Política da República. Alude-se à inutilidade da decisão do Plenário na argüição de inconstitucionalidade, uma vez que, na inicial, apontara-se a desarmonia com a Carta do artigo 29 da Lei nº 7.799/89, enquanto o Colegiado Maior apreciou a matéria sob o ângulo do artigo 30, § 2º, do diploma. Insiste-se na contrariedade do artigo 29 da Lei nº 7.799/89 ao Diploma Máximo, por olvidar os princípios da irretroatividade das leis e da anterioridade. Sustenta-se que a referida lei foi publicada no Diário de 11 de julho de 1989, não podendo, portanto, retroagir a janeiro daquele ano, até porque o fato gerador do Imposto de Renda abrange um determinado interregno e, uma vez iniciado este, nenhuma lei posterior poderá influir na obrigação. Afirma-se que o contribuinte conta com o direito de apurar os lucros reais e o tributo sobre ele incidente de acordo com a legislação vigente no dia em que começado o período-base, no caso, 1º de janeiro de 1989, e que o Fisco tem a obrigação de aferir a inflação de forma igual para todos, procedimento de resto obstado mediante o citado preceito legal, que implicou a alteração do lucro real dos contribuintes, gerando aumento fictício.
A Fazenda Nacional apresentou as contra-razões de folha 290 a 295, defendendo que a atualização monetária da base de cálculo do tributo “não traduz majoração do pré-existente, devendo a utilização dos critérios de atualização monetária definidos na lei se fazer nos termos e nos limites por ela impostos”.
O Juízo primeiro de admissibilidade registrou a relevância da matéria, a ensejar o pronunciamento desta Corte (folha 297).
A Procuradoria Geral da República emitiu o parecer de folha 308 a 310, preconizando o não-conhecimento do recurso.
É o relatório.

VOTO: Os pressupostos gerais de recorribilidade foram observados. Os documentos de folhas 22 a 32, 149, 158 e 306 revelam regular a representação processual, estando à folha 299 a guia comprobatória do preparo. Quanto à oportunidade, constata-se a publicação do acórdão inicialmente proferido no Diário de 19 de janeiro de 1994, quarta-feira (folha 252), e, portanto, no curso das férias coletivas. Seguiram-se embargos declaratórios em 28 imediato, sexta-feira (folha 253). O acórdão integrativo foi veiculado no Diário de 25 de maio de 1994, quarta-feira (folha 269), vindo à balha a manifestação de inconformismo em 1º de junho seguinte, quarta-feira (folha 270).
Em jogo faz-se o disposto nos artigos 29 e 30 da Lei nº 7.799/89, que entrou em vigor em 10 de julho de 1989. Eis os textos respectivos:

Art. 29. A correção monetária de que trata esta Lei será efetuada a partir do balanço levantado em 31 de dezembro de 1988.
Art. 30. Para efeito da conversão em número de BTN, os saldos das contas sujeitas à correção monetária, existentes em 31 de janeiro de 1989, serão atualizados monetariamente tomando-se por base o valor da OTN de NCz$ 6,92.
§ 1° Os saldos das contas sujeitas à correção monetária, atualizados na forma deste artigo, serão convertidos em número de BTN mediante a sua divisão pelo valor do BTN de NCz$ 1,00.
§ 2° Os valores acrescidos às contas sujeitas à correção monetária, a partir de 1° de fevereiro até 30 de junho de 1989, serão convertidos em número de BTN mediante a sua divisão pelo valor do BTN vigente no mês do acréscimo.

Esclareça-se que a Medida Provisória nº 32, de 15 de janeiro de 1989, transformada na Lei nº 7.730, de 31 de janeiro de 1989, afastou, mediante revogação do artigo 185 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, bem como do Decreto nº 2.341, de 29 de junho de 1987, a desindexação do balanço, o denominado Plano Verão. Eis que, fixada a correção monetária com base no valor da OTN, de NCz$ 6,92 (seis cruzados novos e noventa e dois centavos), em junho de 1989, para efeito de determinação do lucro real – base de cálculo do imposto de renda das pessoas jurídicas –, previu-se, no artigo 2º da Lei nº 7.799/89, a atualização monetária das demonstrações financeiras, revelando-a, o citado artigo, na forma estabelecida em artigos seguintes. Então, dispôs-se que seria ela efetuada a partir do balanço levantado em 31 de dezembro de 1988 – artigo 29 –, preceituando o § 2º do artigo 30 que, a partir de 1º de fevereiro, até 30 de junho de 1989, considerar-se-ia a conversão em número de BTN vigente no mês de acréscimo. Conclui-se que a normatividade surgida ao término do primeiro semestre veio a implicar modificação substancial, refletindo no cálculo do próprio imposto de renda. No caso, não se trata de simples atualização de tributo devido, mas da tomada de fatos surgidos sob regência específica para dar-se a eles nova conotação jurídica.
Conforme ressaltado na inicial, o sistema reintroduzido mediante a Lei nº 7.799/89 tem repercussão no resultado da incidência do imposto sobre a renda, dependendo, quanto à geração de saldo credor ou devedor, da relação de valores entre o ativo permanente e o patrimônio líquido. Com a sistemática, tem-se o surgimento de renda a ser tributada, de lucro a servir de base no cálculo do imposto de renda.
Ainda que se potencialize a circunstância de, para efeito de se saber o imposto de renda devido, levar-se em conta o fechamento do balanço em 1989, o texto da Lei nº 7.799/89, a alcançar a correção monetária das demonstrações financeiras no período de 1º de fevereiro até 30 de junho de 1989, acabou por implicar a retroatividade vedada no artigo 150, inciso III, alínea “a”, da Constituição. Em suma, a recorrente sofreu os efeitos da situação jurídica criada pela Lei nº 7.730/89, no que prevista a desindexação, com o acerto relativo ao mês de janeiro de 1989. Foi surpreendida, no mês de junho de 1989, com a modificação substancial introduzida inicialmente pela Medida Provisória nº 68 e, depois, pela Lei de conversão nº 7.799/89, implementada a retroatividade para cobrir período de disciplina diversa, quando inexistente a correção. Atos e fatos jurídicos ocorridos antes da lei em comento foram apanhados, em retroatividade que contraria até mesmo o objetivo maior da normatização, que é a segurança jurídica.
Não se coloca em dúvida a possibilidade constitucional da volta à indexação do balanço. O que cumpre notar é que o período coberto pelo diploma que a afastou não poderia ser considerado, como foi, pelo § 2º do artigo 30 da Lei nº 7.799/89, gerando, sob o ângulo da retroação, situação jurídica gravosa, porquanto surgida renda sem que diploma anterior dispusesse sobre os respectivos fatos geradores. Vale ter presente o que asseverado na inicial:

[...]

Como a correção monetária de balanço determina indubitavelmente uma nova aquisição de renda a ser adicionada ao lucro real, provocando como conseqüência fatal o aumento do imposto de renda a pagar, a lei que a instituiu só poderá ter eficácia no exercício seguinte àquele em que ela foi publicada, em respeito ao princípio constitucional da anterioridade, consagrada pela nova Carta em seu art. 150, III, “b”, in verbis:

Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III – Cobrar tributos:

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.
Conforme salientado pela melhor doutrina – Geraldo Ataliba e Roque Antônio Carraza –, o princípio da irretroatividade da norma há de ser perquirido e preservado no âmbito da eficácia, dos resultados provocados pelas leis. Fatos anteriores à Lei nº 7.799/89, a demonstração financeira tal como resultante da lei revogada – nº 7.730, de 31 de janeiro de 1989 –, não podem ser apanhados por diploma a eles posterior, sob pena de solapar o sistema voltado à preservação da segurança jurídica.
Há de se estabelecer distinção entre o período-base de incidência das pessoas jurídicas – de 1º de janeiro a 31 de dezembro – e a disciplina de fatos verificados nesse interregno, devendo ser preservada a regência do momento em que hajam surgido. Esse enfoque esteve presente quando da prolação da sentença, oportunidade na qual se afastou, por inconstitucional, a correção versada no artigo 29 da Lei nº 7.799/89 – folha 122 a 133.
Em grau de apelação, precedendo o incidente de inconstitucionalidade, o então juiz Teori Zavascki deixou explicitado no voto proferido que o princípio da anterioridade tem como escopo maior a ciência prévia, ao contribuinte, da regência do tributo, dele não podendo ser retirado o sentido prático e, portanto, a respectiva concretude. Sua Excelência estabeleceu, no voto de folha 164 a 169, a diferença entre os princípios da irretroatividade e da anterioridade, assinalando que o primeiro somente é observável em relação aos tributos não alcançados pelo segundo. Em última análise, observada a ordem natural das coisas, o sentido vernacular e técnico dos vocábulos, a anterioridade já exclui a retroação da norma. Então, proclamou que a lei só incide sobre fatos que venham a ocorrer após a sua vigência – princípio da irretroatividade – e o tributo devido em razão de tal incidência só pode ser cobrado a partir do exercício seguinte ao da sua publicação. Por isso, concluiu Sua Excelência que, ante o princípio da irretroatividade, a Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989, não poderia ter incidência sobre a desvalorização da moeda ocorrida no período anterior à própria vigência. Em relação a tal espaço de tempo, ter-se-ia de atentar para o texto do artigo 29 da Lei nº 7.730, de 31 de janeiro de 1989. Entendeu Sua Excelência não pela inconstitucionalidade da Lei nº 7.799/89, mas pelo conflito, com a Carta da República, do disposto no § 2º do artigo 30 da lei, que fixou a correção monetária incidente sobre fatos surgidos no período pretérito. Confira-se com o que se contém à folha 164 à 169.
No mais, outra foi a conclusão do Colegiado de origem ao dirimir o incidente de inconstitucionalidade. Prevaleceu a óptica do juiz Ronaldo Ponzi que, às folhas 201 e 202, ficou assim sintetizada:

a) O princípio de irretroatividade tributária não afasta toda e qualquer retroatividade, mas, apenas, aquela que fere o direito adquirido, que em matéria de imposto de renda se traduz em direito de se ver cobrado do referido imposto sem novas hipóteses de incidência ou sem majorações, ocorridas após o início do período-base;
b) Na espécie, o dispositivo legal acoimado de inconstitucional não majorou o imposto de renda, mas, apenas, de forma legal e oportuna, determinou a incidência de correção monetária, em face da inflação efetivamente ocorrida no período de 01/02/89 a 30/06/89 em relação às demonstrações financeiras, como forma de tornar adequadas aos efeitos da inflação os respectivos valores;
c) Tal procedimento, aliás, consistente em considerar os efeitos da espiral inflacionária sobre as demonstrações financeiras, tem se constituído em objeto de inúmeras postulações de contribuintes, no sentido de tornar realísticos os resultados obtidos pelas empresas, tese que tem merecido integral acolhimento por parte do Poder Judiciário;
d) Convém assinalar que o dispositivo legal de que se trata manteve o mesmo critério de correção monetária existente no início do exercício social de 1989, lastreado na variação do IPC.

Sob o ângulo lógico, o que consignado no acórdão relativo ao incidente contraria o princípio do terceiro excluído – uma coisa é ou não é. Em se tratando de retroatividade, considerados especialmente os campos penal – quando a visão se passa, em termos de gravame, para o acusado – e tributário – levando em conta a exacerbação do ônus para o contribuinte –, não cabe a admissão do meio-termo, distinguindo-se a gradação da retroatividade. Há mais, entretanto. No próprio acórdão proferido, indica-se como óbice à retroatividade da norma a existência de direito adquirido. Ora, se, até junho de 1989, esteve em vigor sistema que afastava a indexação, é possível restabelecê-la de forma retroativa, apanhar fatos verificados no período de vigência do diploma anterior? Operada a retroatividade, não se alcança o direito adquirido do contribuinte? O que assentado pela Corte de origem importa no desconhecimento de direito introduzido pela Lei nº 7.730, de 31 de janeiro de 1989, quando, a partir do Plano Verão, teve-se presente o afastamento da inflação desenfreada. A citada lei, mediante o artigo 29, implicou a revogação da Lei das Sociedades Anônimas, mais precisamente do artigo 185 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, bem como das normas de correção monetária de balanço previstas no Decreto-Lei nº 2.341, de 29 de junho de 1987, e isso se fez não de maneira implícita, por meio de revogação tácita, mas de modo a deixar o término da indexação estreme de dúvidas. A única ressalva contemplada ficou restrita à correção no mês de janeiro, dispondo, então, o artigo 30:

Art. 30. No período-base de 1989, a pessoa jurídica deverá efetuar a correção monetária das demonstrações financeiras de modo a refletir os efeitos da desvalorização da moeda observada anteriormente à vigência desta Lei.
§ 1º Na correção monetária de que trata este artigo a pessoa jurídica deverá utilizar a OTN de NCz$ 6,92 (seis cruzados novos e noventa e dois centavos).

Nesse contexto normativo, a recorrente viu surgir, no próprio patrimônio, o que assegurado pela Lei nº 7.730/89, ou seja, o término da indexação do balanço, afastada a correção do mês de janeiro, e, vindo à balha a Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989, com previsão retroativa, forçoso é concluir, como fez o relator na origem – hoje ministro do Superior Tribunal de Justiça –, Teori Zavascki, pela inconstitucionalidade do § 2º do artigo 30 nela inserto.
É como voto na espécie, restabelecendo a concessão da segurança e consignando que, no caso, incide o princípio da anterioridade, a apanhar o balanço do ano em que editada a lei.

*acordão pendente de publicação

Fonte: STF

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